O
sistema econômico como hoje conhecemos se baseia na confiança no
valor dos meios de pagamento. O atestado do valor do dinheiro é
decorrência da soberania do rei ou da nação, e é por isso que a
falsificação de dinheiro é considerada um crime de lesa-majestade
ou lesa-pátria.
Ora,
a crença na autenticidade do dinheiro é para a economia tão
fundamental quanto é a crença da autenticidade da informação para
o funcionamento da democracia. Uma democracia consiste em que as
pessoas decidam o que é melhor para si. E só se pode decidir o que
é melhor para si quando bem informado sobre as consequências de uma
decisão. Se o cidadão se baseia em informações falsas, sua
decisão, possivelmente, fará mal a ele mesmo.
A
presente pandemia mostra isso claramente. As pessoas estão
soterradas por
informação de má qualidade, e isso as leva a ter
comportamentos que atentam contra si mesmas, quebrando a quarentena.
As informações embasadas podem até chegar a elas, mas se perdem em
um mar de desinformação que impede a média da população de
discernir o real do imaginário. Por fim, própria consciência geral
da existência de fake news é usada pelos difusores das
mesmas, na medida em que completam sua enxurrada de mentiras com mais
esta: a de que a verdade é fake
news.
Não
é por acaso que esse esgoto de informação inunda a intimidade das
pessoas, a ponto de impedir a busca pela verdade de alcançar o mais
remoto sucesso. Na fábrica de mentiras foi investido muito dinheiro
e avançadas técnicas de propaganda, garantindo que a mensagem
chegue a seu público-alvo e atinja os objetivos desejados pelos seus
formuladores.
Quem
planta a ignorância não o faz por ignorância. O mentiroso não
mente por acreditar na mentira, mas porque ela lhe é conveniente. Já
quem repassa a informação falsa nas redes sociais, por sua vez, tem
muitas vezes a mesma inocência de quem repassa dinheiro falso por
não conseguir distingui-lo do dinheiro autêntico.
O
justo zelo pela liberdade de expressão e o exagero relativista fez
com que postergássemos em demasiado o remédio institucional para a
falsificação de informação. Em outras palavras, não punimos com
o rigor da lei os que difundem deliberadamente a mentira, e essa
mentira agora nos está matando. O combate ao vírus não dá margem
a que relativizemos consensos científicos sólidos.
A
civilização precisa urgentemente se tornar imune à falsificação
de informação. Cabe às instituições reprimir essa prática que,
a cada dia, parece fazer mais mal à sociedade. Quem difunde
conscientemente a mentira deve, no mínimo, ser punido com o mesmo
rigor destinado a quem falsifica dinheiro. Ou com um rigor até
maior, visto que suas mentiras estão tirando vidas humanas. É
preciso, sim, ter cautela para não ferir a liberdade de expressão.
Mas uma solução institucional nesse sentido há de ser possível,
tanto quanto a opinião se distancia da mentira deslavada.