quinta-feira, 20 de novembro de 2008

A CONSCIÊNCIA NEGRA

"Hoje não é dia do negro. Hoje é dia da consciência negra, dia de se discutir a questão negra."

O pensamento acima é de Martinho da Vila, dito em uma entrevista hoje, Dia da Consciência Negra.
É bem verdade que o leigo, especialmente o branco leigo, tem certa dificuldade em entender o que seja a consciência negra. Um pode dizer: "Que hoje seja Dia de Zumbi eu entendo. Mas afinal, o que é dia da Consciência Negra?"

Tomei por desafio responder a essa pergunta. Talvez, por ser historiador, a melhor resposta que encontrei penda para o meu lado. A meu ver, a consciência negra é a consciência histórica do negro. Histórica em seu sentido amplo, não dizendo respeito apenas ao passado, mas ao tempo presente, e às perspectivas do futuro.

O brasileiro deve saber que a situação atual do negro é resultado da nossa História. A consciência do passado é que nos permite celebrar nossos heróis, como Zumbi e João Cândido, o Almirante negro, líder da Revolta da Chibata. Digo "nossos heróis" porque são heróis da liberdade, e não apenas dos negros. A necessidade de afirmação da atuação de negros na História se torna necessária pelo fato de a disciplina histórica ter uma tradição secular de eurocentrismo.

A consciência da História do Negro no tempo presente é a consciência política. É o brasileiro, em geral, e o negro, em particular, saberem que medidas devem ser tomadas para diminuir e erradicar a desigualdade racial. É saber que a luta passada continua hoje.

A consciência das perspectivas futuras é saber o que desejamos construir para as relações raciais. É o brasileiro, em geral, e o negro, em particular, saberem se querem uma viver em uma sociedade igualitária, em que a questão racial seja, de fato superada.

A questão racial não é a única do Brasil. A ela somam-se a questão do índio, a questão do nordestino, a questão ambiental, etc. A questão racial não é maior do que a questão social, e o brasileiro, em geral, e o negro, em particular, não devem perder de vista essa questão maior.

A questão social é também mais difícil de resolver do que a racial, pois esta implica em tirar negros da camada inferior da sociedade e colocá-los no alto e, da mesma maneira, tirar alguns brancos do alto e colocá-los um pouco mais em baixo, de modo que haja homogeneidade em todas as camadas. Já resolver aquela questão maior, a social, implica em redistribuir toda a renda, de modo que haja apenas uma camada social, ou pelo menos uma distribuição de renda bem mais justa.

Entretanto, não se pode tampouco cair na cilada reacionária de ignorar a questão racial. Ainda vivemos em uma sociedade de racismo cruel, em que, por exemplo, as mortes de muitos negros não são nem investigadas, se simplesmente a polícia alegar que eram bandidos.

Nesse sentido, o simples fato de haver um dia para discutirmos a questão negra já é um grande avanço.

Leandro Coutinho Murad