quarta-feira, 12 de outubro de 2016

A LUTA POLÍTICA

Vejo que a luta política é hoje, em essência, a mesma do século XVIII. É a luta do privilégio contra a inclusão.


O que mudou nesse tempo foi o papel do estado. Só no século XX alguns países chegaram perto do sufrágio universal. Conforme esse avanço é alcançado, o estado, se efetivamente democrático, tende a ser uma ferramenta mais de inclusão do que de manutenção de privilégios.


Assim, a identificação de uma menor participação do estado na economia com uma maior liberdade econômica inspira cuidados. O neoliberalismo não traz liberdade, antes favorece a liberdade do mais forte e diminui a do mais fraco. O neoliberalismo concentra a renda e, logo, a liberdade. Nesse sentido, cito o Karl Polanyi:


“(...) As classes abastadas gozam da liberdade que lhes oferece o ócio em segurança; elas estão naturalmente menos propensas a ampliar a liberdade na sociedade do que aquelas que, por falta de rendas, têm que se contentar com um mínimo de liberdade. Isto é perfeitamente visível quando surge uma compulsão no sentido de uma distribuição mais justa de renda, do lazer e da segurança. Embora as restrições se apliquem a todos, os privilegiados tendem a ressentir-se, como se elas fossem dirigidas apenas contra eles. Eles falam em escravidão, quando de fato se pretende apenas distribuir entre os outros a liberdade de que eles mesmos gozam. É verdade que pode ocorrer inicialmente uma diminuição do seu lazer e da sua segurança e, portanto, da sua liberdade, para que seja elevado o nível de liberdade para todos. Todavia, uma tal mudança, a remodelação e a ampliação das liberdades, não deve servir de motivo para que se afirme que a nova situação é, necessariamente, menos livre do que a anterior” (POLANYI, Karl. A Grande transformação: as origens de nossa época. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000, p. 295).


O estado ser subjugado à população é uma premissa de qualquer modelo desejável. A concentração de poder, seja no estado, seja no mercado, favorece o mais forte, que domina o mais fraco. Por isso a importância do sufrágio universal: ele pulveriza o poder político. Mas não adianta as pessoas terem poder de decisão sobre o estado e esse não ter capacidade de interferir na realidade.


Por fim, falo em “neoliberalismo”, e não em “liberalismo”, porque liberalismo é um conceito que me é caro. O liberalismo tem a ver com liberdade, mas também igualdade e fraternidade, com todas as liberdades comportamentais, com direitos humanos, com o Estado Democrático de Direito, com as garantias constitucionais, com a presunção de inocência, contraditório e ampla defesa. Tem a ver com aquelas mesmas lutas do século XVIII, contra o privilégio e pela inclusão política. Liberal é uma palavra bonita demais para designar o sujeito que só quer deixar de pagar imposto e manter privilégios. A este, fica melhor uma palavra feia: neoliberal.