Nestas
épocas
de
acirramento
político, o excesso de chatice é a
grande
reclamação dos frequentadores do facebook. Os que são de direita
não aguentam os posts de esquerda e os de esquerda não toleram os
posts de direita. Os de centro não suportam ambos. Uma solução
fácil é deixar de seguir os chatos, os que dizem coisas incômodas
e os que pensam diferente de você. É a saída mais confortável,
certamente, mas esse stalinismo virtual tem seu preço.
***
Depois
de alguns unfollows,
esta janela para a realidade passa a exibir a tendência a
que
você mesmo direcionou: um mundo à sua imagem e semelhança. O
problema começa quando você não percebe isso e passa a achar que a
realidade é mesmo assim, do jeito que você quer que ela seja.
Lembro
que, logo após a recente vitória da Dilma nas urnas, uma pessoa
postou: “muito estranho esse resultado... só vejo gente reclamando
por aqui, ninguém comemorando”. Só que, enquanto a timeline
dela era um mar de lamentação e inconformismo, a minha parecia uma
festa do Centro Popular de Cultura da UNE em 1963. Enquanto
isso, a
realidade das urnas mostrava a média entre os dois mundos virtuais
de fantasia.
Por
que essa diferença? Porque o facebook, produto comercial que é, é
programado para mostrar o que você quer ver. Os “deixar de seguir”
e “não quero ver isso” apenas reforçam esse processo. Indo por
essa via confortável, sua “janela” vai ficar tão tendenciosa
quanto uma rede de televisão que seleciona as notícias conforme os
interesses de seus donos.
O
resultado é o reforço da percepção seletiva: como você só vê
opiniões que confirmam o que você pensa, a sua intolerância com as
ideias opostas aumentará. “Como essa pessoa pode pensar isso, se
todo
mundo
diz o contrário? Só pode ser maluco”. A essa altura, já se
esqueceu de
que
todo
mundo
não é todo o mundo.
Não
ouvir o outro, por mais “chato” que ele seja, é deslegitimar o
outro. Deslegitimar o outro é matá-lo, fingir que ele não existe.
É, por exemplo, fingir que todo mundo que votou na Dilma recebe
bolsa família e, por isso, não deve ser considerado. Ou (para não
sair da autocrítica) fingir que qualquer que reclame do governo é
elite burguesa e, por isso, não deve ser considerado.
Assim,
não consideramos o outro, matamos o outro. E quando se mata o outro,
não há troca. Vivemos então de casamentos entre primos, promovendo
futuras doenças congênitas. A dificuldade de se conviver com o
outro é grande, mas a necessidade de fazê-lo é ainda maior.
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Posto
isso, digo agora aos que pedem o tal do impeachment:
vocês querem fingir que os 54% de eleitores que votaram na Dilma
simplesmente não existem, ou não devem ser considerados. O mandato
dela é efeito do voto dessas pessoas, e não sua causa. Se ela
deixar o cargo nós não deixaremos de existir, nem mudaremos de
opinião. Vocês não conseguirão, com seus golpes, esculpir a
realidade à sua imagem e semelhança. Porque cê mata uma e vem
outra em seu lugar.